"O Governo continua sem revelar o valor dos agravamentos ou bonificações nos descontos dos trabalhadores para a Segurança Social, a aplicar consoante o número de filhos. No final da última reunião da concertação social, José Sócrates anunciou a intenção de aumentar as contribuições dos casais sem filhos e baixar os descontos para as famílias numerosas."
in Sic Online
Desde cedo que a Mariazinha se lembra de ouvir a sua mãe apresentá-la aos amigos como:
- Este é o meu abono de família!
Em breve, esta apresentação em tom de brincadeira será a mais pura verdade. E é verdade que a taxa de natalidade é baixa. E é verdade que os portugueses têm cada vez menos filhos. E é verdade que a família goza de protecção constitucional (art. 67.º da CRP).
Mas é também verdade que o direito de constituir família (art. 36.º da CRP) tem uma vertente negativa, o direito de não constituir família. E é também verdade que ter ou não ter filhos integra o direito ao desenvolvimento da personalidade (art. 26.º da CRP).
Se é bom, saudável e constitucional que se beneficie quem tem filhos, é mau, perigoso e constitucionalmente duvidoso penalizar quem não quer, não tem, não pode. Concordo com o benefício. Mas não posso concordar com a penalização.
É necessário incentivar a natalidade. Mas a natalidade incentiva-se gerando condições efectivas para ter e educar os filhos. Legislando para uma maior protecção da maternidade e da paternidade (como prescrevem os arts . 67.º e 68.º da CRP), construindo infra-estruturas de apoio (quem tem filhos pequenos sabe a dificuldade que se experimenta para encontrar um infantário), melhorando a qualidade de ensino (art. 74.º da CRP) e o sistema de saúde, promovendo a empregabilidade de pais e filhos, criando um ambiente de estabilidade para que os pais de amanhã vejam um futuro risonho para os seus abonos de família.
Porque ter um filho é um projecto a longo prazo e não são incentivos "meramente simbólicos" que implantam no coração dos portugueses a vontade de procriar.
A penalização do exercício de um direito constitucionalmente garantido (e mesmo que não o fosse, seria sempre um direito universal) é que não pode ser aceite... e tem reminiscências de um autoritarismo que, a par de outras políticas, se tem manifestado.
E isso é preocupante.